Dona Elvira: sabores de uma infância sem igual - Marcos Antonio Corrêa

Dona Elvira - Foto cedida por João Carlos Santos

Infância. Período que nos marca.

As brincadeiras, os amigos, os professores, a escola. Tudo nos marca.

Somos marcados pelos odores, pelos sabores. Dona Elvira era nossa vizinha no sítio. Quando não estava brincando com o Joãozinho, era ele que em casa estava. Ainda praticamente sem TV, eram brincadeiras de verdade. Brincadeiras que exigiam imaginação e muitas vezes, a fabricação do próprio brinquedo.

Foto ilustrativa - Fonte Google
Além disso, particularmente, era o cheiro e o sabor vindo do Pão de Casa feito por Dona Elvira. Era sagrado. Toda semana saia uma fornada e sem brincadeira: quando lá não estava, aquele cheiro atravessava o córrego que ainda separa nossos sítios e me levava até lá.
Fatias e fatias eram devoradas. Aquele pão quentinho, quando no melhor dos sabores, contava com uma manteiga feita em casa: derretia por aquela massa  e tornava de forma magistral, o que já era sem igual.

A vida na roça era muito boa. O tempo passava devagar. Tínhamos tempo de ver o tempo passar. Subir nas árvores, escutar os pássaros, saborear cada momento. A novidade não era sobressaltada pela ansiedade. Vivíamos muito e com muito tempo para olhar nos olhos de nossos pais, amigos, vizinhos. Conversar de verdade. Nos ajudar quando era preciso.

Logico que tínhamos problemas. Não sei se por ser criança, as situações problemáticas eram resolvidas também com certa conformidade, sem muito alarde.
Como hoje explicar para as crianças a alegria em sentir um cheiro de um pão caseiro? Que isso era prazeroso e esperado a cada semana? A calma e a alegria de Dona Elvira em nos ver devorar cada pedaço de pão, exalava uma bondade sem igual. Quase sempre presenteava com mais um ou outro pão, para trazer em casa.

Nossa vida no Bugre era assim. Uma calma, tranquilidade e solidariedade que não conseguimos vivenciar nos dias de hoje. Hoje temos a necessidade. A rapidez, o não poder perder tempo. Tudo tem que ser rápido. Fazer pão em casa para que? Tudo pode ser industrializado.

Na verdade, não comemos mais: devoramos. E ao devorar tudo a nossa volta, não percebemos que juntamente devoramos nosso bem maior: nossa saúde mental, nosso divino tempo que nos resta até o suspiro final. As gerações de nossos pais tiveram dias difíceis sim. Mas viveram numa época que muitos de nós, só agora, aprendemos a valorizar.

Saudades da Senhora Dona Elvira. De sua grande sabedoria. De seu jeito todo especial de fazer as coisas e acolher o outro.


Fica aqui o registro e a saudade. Ao mesmo tempo a tristeza de nossas crianças de hoje, jamais poderem vivenciar tal situação. 
Durante as Missões Redentoristas no Bugre - A partir da esquerda: Nely, Dona Elvira, João, Sr. Jose Repolhinho, Cida - Retirada do Facebook de João Carlos Santos
Antiga casa do Sr. José Repolhinho e Dona Elvira, durante um encontro familiar no Bugre - Retirada do Facebook de João Carlos Santos

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